domingo, maio 20, 2018

CARTAS PELA LIBERDADE 8: Rigol, de Gispert e Benach, ex-presidentes do Parlamento Catalão, escrevem a Carme Forcadell

Núria de Gispert, Joan Rigol, Ernest Benach e Carme Forcadell

Querida Carme,
Em 14 de maio passado, elegemos um novo presidente para o Governo Autônomo, como você já deve saber. Quim Torra é esse novo Mui Honorável Presidente, e estamos contentes por finalmente podermos encerrar os efeitos do 155 e começar a recuperar a normalidade das nossas instituições. Esperamos que continue assim – e que não tenhamos de lamentar novamente situações arbitrárias e injustas, como as que temos sofrido nos últimos meses. Esta alegria, anda assim, é muito relativa - e se refere a um momento muito pontual, já que a tristeza pela situação que vivem as pessoas encarceradas e as que estão no exílio é permanente.
Logo que acabou a plenária, os serviços de protocolo – diligentes como sempre – organizaram uma fotografia com os presidentes do Governo Autônomo e do Parlamento que estavam presentes em nosso Salão de Sessões. Lá estavam o presidente Torra e o presidente Torrent, acompanhados dos presidentes Montilla e Mas, além de nós três, teus predecessores no cargo. Mas faltava você, Carme; e faltava também o presidente Puigdemont. São ausências forçadas e injustas. Por outras circunstâncias, não estavam presentes os presidentes Maragal e Pujol, mas a sua ausência doía no fundo do coração, nos fazia muito mal, foi o que comentamos entre nós. E nesta sua ausência dolorosa, estamos ao seu lado, Carme, e partilhamos do seu sofrimento.
Temos tido notícias suas pela sua família, pelas cartas que vem escrevendo e que recebemos. Ou que pessoas que nos apreciam, e sabem que sofremos por você, nos explicam – e nos fazem chegar fragmentos, ou simplesmente lembranças, que agradecemos sempre.
Conhecemos a sua fortaleza, mas sabemos também que, nesses momentos graves, é preciso um pouco mais do que isso para poder superar o dia-a-dia da prisão. Que, como comentamos mais de uma vez, deve ser horroroso para uma pessoa cheia de vida como você, que sempre estava no lugar certo por estar em toda parte, com uma energia infinita e contagiante. É por isso que queremos dizer que você está presente em nossos pensamentos, no dia-a-dia, em tudo aquilo que fede e que não podemos fazer, e também em tudo que desejaríamos poder fazer, mas que não nos deixam.
Falam que você cometeu um delito horrível: permitir o debate, o debate democrático, dentro de uma instituição como o parlamento – onde se trata, precisamente, de fazer uso da palavra para debater, para confrontar posicionamentos políticos. É tão incompreensível, Carme! É o que todos nós sempre fizemos: dar a palavra aos deputados e às deputadas, representantes do povo soberano, para que falassem, debatessem, discutissem também - e, ao final, votassem. Esta é a base de toda democracia. Para os opositores, este é o seu delito, e por ele te trancaram numa prisão cinza e triste, longe de casa, longe dos seus. Você é vítima de haver dado voz ao povo, o que é fundamental e acaba por definir a qualidade de uma democracia.
Sabemos que é muito fácil dizer e pedir o que vamos pedir, embora não seja tão fácil assim de fazer; apesar de tudo, porém, vamos pedir. Continuem fortes! Resistam! Pensem que milhares e milhares de cidadãs e de cidadãos do nosso país têm consciência do sacrifício que vocês fizeram. E que vocês são parte, com todas as honras, da memória coletiva da nossa gente, na caminhada rumo à plena liberdade. Na caminhada rumo à tão sonhada república.
O amarelo, aquele amarelo que se popularizou na ANC (Assembleia Nacional Catalã), quando você a presidia, converteu-se no símbolo da liberdade de vocês. Quando cruzamos com uma pessoa que traz um laço amarelo, uma flor amarela, um detalhe amarelo, um lenço amarelo e até mesmo uma gravata amarela, ocorre uma cumplicidade instantânea, invisível aos olhos, que faz pensar que vocês estão presentes, de modo permanente, na mente de muitas, muitíssimas pessoas que também sofrem com a situação dos presos políticos, que desejariam vê-los livres e que desejariam ter todos vocês junto de nós.
Isso sucede, também, porque a esperança da Catalunha depende da sua liberdade, da liberdade de todos os presos e presas, do retorno dos exilados e exiladas. Esta liberdade é a única resposta que pode ser dada a uma situação tão injusta quanto pode ser a prisão preventiva com que penalizaram todos vocês.
Carme, queremos que saiba que é um privilégio compartilhar com você a honra de haver presidido a nossa câmara, o Parlamento da Catalunha. E queremos que saiba também que precisamos abraçá-la bem forte, e abraçar também a conselheira Dolors Bassa, a quem pedimos saudar em nosso nome. Chegamos a organizar uma visita a Alcalà-Meco, mas o custo se revelou muito alto, altíssimo. Com detalhes dessa natureza, inteiramo-nos do cinzento que há em tudo o que hoje te rodeia, das dificuldades para desfrutar de um mínimo de normalidade. É ignominioso haver presos políticos, mas, em termos de país, é uma vergonha que a presidente do nosso Parlamento esteja privada de sua liberdade por haver facilitado, ao povo e aos seus representantes, a oportunidade de decidir seu futuro. É um insulto às nossas instituições e à nossa história, que neste momento personificamos em você.
Muito ânimo, Carme. Sabe que estamos com você e que pode dispor de nós para tudo que necessitar. Tente evitar, na medida do possível, os momentos difíceis e tristes, pois sabemos que eles existem. E saiba que precisamos de você ativa, inquieta, incansável. Precisamos de você na liderança e te queremos ver de volta à casa, com os seus, com todos nós.
Muito ânimo, muita força e um abraço imenso!
Joan Rigol i Roig
Ernest Benach i Pascual
Núria de Gispert i Català
Presidentes do Parlamento da Catalunha (1999-2015)

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