quinta-feira, julho 13, 2006

Paixão renovada pelas palavras

Lá vem a Flip de novo... e lá se vai a minha alma, de armas e bagagens, pra Parati. Pelo terceiro ano consecutivo, aproveito a felicidade mansa de presenciar encontros com o que há de melhor no pensamento contemporâneo, na literatura urgente ou na memória das grandes obras.
A Festa Literária Internacional de Parati não é festa por acaso, nem é sucesso por acaso. É festa porque celebra, de fato, a literatura como ponte entre culturas, cabeças e ideologias. Como flagrante do tempo de hoje ou retrato, em vivas cores, do tempo de sempre. E é sucesso porque identifica e atende muito bem à demanda pelas palavras verdadeiras, vigorosas e sem maquiagem que constroem o agora. Ou pelas palavras emblemáticas que nos fazem visitar as fronteiras do tempo. Enfim, a paixão por palavras tem público, e que público! Gente que não se perturba diante da perspectiva de passar, por exemplo, uma manhã inteira sentada numa fila civilizada, em plena Copacabana, para garantir seus ingressos logo na primeira hora, e de uma só vez.
Participei ontem dessa fila - que na verdade foi o meu primeiro evento pré-Flip 2006. E confesso que me diverti com o clima descontraído que se criou na antiga galeria do Bruni Copacabana, o saudoso cineminha que, demolido, deu lugar à ampliação da sofisticada loja Modern Sound, a meca dos fanáticos por música onde seriam vendidos, a partir do meio-dia, os almejados ingressos para a Flip.
Rato de livraria que se preza tem prazer em compartilhar. E na fila da Flip não foi diferente; as pessoas se organizavam naturalmente, procuravam acomodar-se e ajudar as outras, promover tranqüilidade e criar alguma graça com que passar o tempo - tudo isso de um jeito bem carioca, sem estresse.
Um pouco de cansaço? Sim, vá lá, concedo. Mas foi quase nada. Eu, que cheguei munida de um prático banquinho de armar, nem precisei dele; acabei emprestando e me sentei no banco da fila (é verdade, havia dois, um para os idosos e outro para o público em geral), batendo papo com os vizinhos e assistindo, de camarote, ao sol que se insinuava pela Rua Barata Ribeiro com sua loja de frutas que um caro amigo adorava, a lojinha nova da Cafeína e o distinto Clube Israelita Brasileiro.
Consegui meus ingressos, todos eles. Não sem uma generosa dose de burocracia, que dava uma prévia do que viria a ser o dia dos atendentes da TicketMaster. Um pouco de confusão na primeira hora, ansiedades à solta, mas reforço meu estoque de paciência, respiro fundo e espero, aliviada, a minuciosa contagem e conferência dos ingressos. Entrego a procuração que garante a meia-entrada de uma amiga e assisto, sem acreditar, à "carimbagem" e preenchimento dessas entradas, uma a uma, pelo atendente. Lá fora, a fila começava a enlouquecer com os 40 minutos que levou o atendimento das primeiras três, quatro pessoas. Quanto tempo levariam as centenas de outras que aguardavam?
Há que se reconhecer: a Flip tenta, a cada ano, melhorar a venda dos ingressos. E até tem conseguido progressos, mas como agradar a todos? O evento é um só, mas a paixão das pessoas é maior que ele e cresce a cada ano, então...
Desta vez, consegui. Outras pessoas também conseguiram. Na saída, despeço-me dos novos amigos que, alegres, já marcam encontros na entrada da bela tenda, encantados com a programação intensa e promissora.
E desço a Rua Santa Clara com um doce cheirinho de tinta sobre papel a preencher-me a alma.

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