domingo, junho 29, 2008

... antes de me despedir, deixo ao sambista mais novo o meu pedido final...



Verdes e rosas mais pálidos, gritos de guerra mais roucos, ruas do Rio mais caladas, cortadas de um luto discreto, fundo, uma dor do povo.
Mestre Jamelão se despede em farto, amplo cortejo. Sob as palmas da platéia que se alonga nos quilômetros e quilômetros do adeus.
O samba sente muito. Mas é o povo que chora. O povo que não pensou duas vezes e foi em peso vê-lo passar pela última vez, interpretando como ninguém uma saudade profunda.
Jamelão saiu de cena como um rei, com a pompa e circunstância que mereceu e conquistou vida afora.
Houve um tempo em que já era tradição: duas semanas antes do Carnaval, as intrigas da oposição sempre espalhavam no Rio de Janeiro que Jamelão tinha morrido. Mas todo mundo sabia que era para enfraquecer a Mangueira. Imagino que ele risse da piada, pois no dia aprazado estava lá ele, com sua voz inconfundível, à frente da mais querida. Era Estandarte de Ouro na cabeça!
Sou o tipo de devota que aprendeu a sonhar com o ZiCartola que nunca viu, que ouvia Matriz e Filial com respeito e reverência - e que sempre chora quando a Velha Guarda entra na avenida com seus ternos de festa.
Com Jamelão não foi diferente: sempre o olhei como um desses seres superiores que detém o segredo de estar no coração do povo. Mas não como uma moda que é esquecida assim que sai de cartaz: Jamelão é pra sempre.

Por onde passou, o cortejo do grande mestre encontrou um olhar perdido, um surdo imaginário a soar compungido, uma cabeça baixa, uma lágrima, mãos em jeito de oração, o silêncio de alguém que saúda de dentro de uma tristeza tímida, sincera.
Há uns quatro anos, acho, tive a felicidade de assistir ao Desfile das Campeãs numa frisa. Minha amada Mangueira, segundo lugar naquele ano, estaria lá. Num dos intervalos, perambulando pela área do bar, pude vê-lo. Pequenino dentro do terno rosa e amparado por dois ou três guardiães da Escola, brilhava com uma força tremenda. Não pude evitar o nó na garganta.
Jamelão, um símbolo e uma voz, já faz muita falta. Mas sei que há de refulgir sempre sobre a Sapucaí, no céu do Carnaval. Não uma estrela, constelação. Não um puxador, um intérprete, como sempre fez questão de dizer. Não um sambista, mas o próprio samba.

Nenhum comentário: